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AS MANEIRAS DE MANDAR E A ETIQUETA

Recentemente, um leitor, incomodado com a maneira como seu superior imediato lhe designa tarefas por meio do correio eletrônico, quis saber se o chefe incorria em algum tipo de “erro gramatical” ou se fazia uso de linguagem inapropriada.

Muito bem. O estilo do referido chefe é bem conhecido de muita gente. Ele é aquele sujeito que, extremamente objetivo, envia mensagens telegráficas do tipo “Favor encaminhar documento até as 15h. Grato”. O que desagrada ao nosso leitor – e constitui objeto de sua dúvida – é o uso do infinitivo impessoal para emitir uma ordem.

De um ponto de vista estritamente gramatical, o infinitivo impessoal pode, sim, exprimir uma ordem. Basta lembrar o uso comum desse tipo de construção por um comandante militar que se dirige às suas tropas: “À direita volver! Apontar armas! Descansar!”. É bom que se diga, no entanto, que esse tipo de comando é impessoal por sua própria natureza, uma vez que dirigido não a um indivíduo, mas a um grupo de pessoas que devem executar as mesmas ações simultaneamente.

O que desagrada ao nosso leitor é, por certo, o grau de impessoalidade das mensagens do chefe, que, conscientemente ou não, torna ostensiva a sua posição hierárquica superior. Não é difícil entender que tal atitude soe, de fato, antipática. Quando o ambiente de trabalho é formal, pode-se, em bom português, empregar o imperativo do verbo “querer” antes do infinitivo para suavizar a ordem: “Sr. fulano, queira encaminhar o documento até as 15h”. Uma locução como “por favor” ou “por gentileza” tornaria ainda melhor essa comunicação. Havendo menos formalidade, o imperativo conjugado na terceira pessoa é o ideal: “Sr. fulano, encaminhe o documento até as 15h, por favor.”

O chefe, por sua vez, pode entender que, em sua posição, não seja necessário dizer “por favor”, afinal, está dando uma ordem. Aqui estamos diante de uma questão de delicadeza – ou mesmo de etiqueta –, pois é evidente que o funcionário sabe que um pedido do chefe é mesmo uma ordem, que não deve ser negligenciada.

O fato é que a ordem pura e simples, seca e rude, pode não ser a melhor maneira de engajar o funcionário na tarefa que deve desempenhar – e o mundo corporativo hoje é atento à importância de fazer o colaborador se sentir parte de um processo, não apenas um subordinado, mero cumpridor de ordens. Justificar um pedido (ou ordem), por exemplo, denota respeito pelo funcionário. Ademais, demonstrar educação faz muita diferença tanto no ambiente de trabalho como nos demais espaços de inter-relação, entre os quais o mundo virtual.

O modo imperativo, apesar do nome que recebe, não serve apenas para emitir ordens. A forma verbal que usamos para mandar (“Saia daqui!”) também é própria para pedir (“Apague a luz ao sair, por favor”), para suplicar (“Rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte”), para aconselhar (“Fique tranquilo e faça o melhor que puder”), para sugerir (“Leve a gravata azul, que combinou com a sua camisa”) ou para convidar (“Venha à nossa casa hoje à noite”). É o contexto que torna explícita a nossa intenção. Se a comunicação for oral, outros elementos, como gestos e entonação, constribuirão para a exata compreensão da mensagem.

Como sabemos, as relações interpessoais são mediadas pela linguagem, cujo uso, por isso mesmo, deve ser objeto de reflexão nas diversas situações de nossa vida. Vale a pena cultivar não só o conhecimento sobre o idioma como também a sensibilidade.

(Thaís Nicoleti)

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